Os meios de comunicação têm noticiado que o preço do álcool em nível de consumidor (na bomba) está subindo em plena safra, surpreendendo o mercado. Pior, oportunistas que se autodenominam consultores declaram, em rede nacional, a estranheza do fato, considerando a plena safra e o crescimento dos estoques de álcool nos depósito das Usinas e distribuidoras.
É certa a variabilidade de preços do álcool na bomba entre estados, decorrência, principalmente, mas não apenas isso, de carga tributária diferenciada, especialmente de ICMS.
Mas é preciso ir mais fundo nesta questão do aumento dos preços em plena safra, para não penalizar o setor, especialmente as Usinas, que tem sido o bode expiatório de todas as mazelas dos governos, das especulações no mercado internacional e até dos cartéis de distribuição.
Preliminarmente, deve ser considerado que o álcool, como combustível, não determina preços, e está sob influência direta do mercado do petróleo. Portanto analisar preços do álcool desconectado dos preços de combustíveis derivados do petróleo é um grande equívoco.
Num quadro de forte crescimento da demanda interna de álcool, em vista do desempenho econômico e de mais carros flex rodando, para uma cadeia produtiva que tem como característica principal a defasagem distribuída entre 3 e 4 anos para se ajustar às novas condições estruturais do mercado, é até elogiável que a situação não esteja pior, senão vejamos.
A crise financeira de 2008 repercutiu diretamente sobre o setor, restringindo fortemente a implantação de novos projetos sucroalcooleiros, a expansão das lavouras, a renovação dos canaviais e os tratos culturais e uso de insumos nos plantios já existentes. Seguramente, houve profundas alterações nas relações de preços de insumos e de produtos finais, seguida de forte restrição de crédito, o que alterou a agenda de novos investimentos e a condução dos projetos maduros. A retomada dos investimentos e os novos projetos de crédito esbarraram em sérias dificuldades na sua viabilização, em vista de exigências ambientais mais rigorosas e mais formalidades burocráticas na contratação. Estima-se que esses efeitos, ainda hoje, repercutem negativamente na oferta de cana para moagem.
Ademais, a elevação dos preços do açúcar no mercado internacional promoveu ajustes na programação de produção de açúcar e álcool nas usinas anexas. Reduziu-se proporcionalmente a produção de álcool, oportunizando mais produção de açúcar para melhorar o faturamento nas Usinas, depois de um período de fraco desempenho nas safras 2009 e 2010.
Por fim, a seca em São Paulo, nesta safra, reduziu em 15% a produtividade da cana. Dado o peso relativo de 60% do Estado de São Paulo na produção do setor, admite-se uma perda de produtividade de 9%, em nível nacional.
Sopesando todos os fatores citados, para uma safra esperada de mais de 650 milhões de toneladas de cana, estima-se colher em torno de 580 milhões, ou seja, uma redução de pelo menos 10,80% na produção de cana, com tendência de se processar mais para açúcar do que para álcool.
Não há surpresas, portanto, para quem acompanha minimamente o comportamento dos preços do álcool em toda a cadeia produtiva, desde as condições de produção da cana, até a distribuição final de seus produtos, aí incluídos os efeitos do petróleo, de outras variáveis de oferta e demanda externa, sempre numa condição de economia aberta.
Não nos parece exagero afirmar que o governo manterá a redução da mistura do álcool à gasolina, e certamente reavaliará os níveis de intervenção na formação de estoques de álcool para a entressafra (warrantagem), porquanto a produção está muito ajustada à demanda, nesta safra de 2011.
Nelson Élio Zanotti
Engenheiro Agrônomo, Sócio-Diretor da CPA, consultor no setor sucroalcooleiro e especialista em gestão ambiental
Wolmar Roque Loss
Engenheiro Agrônomo, consultor em agronegócios, Mestre em Economia Rural e Desenvolvimento Econômico
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