Entrevista – Enio Bergoli

por admin_ideale

 


Com a aprovação do novo Código Florestal pelos deputados federais, o que tem gerado polêmica e interpretação equivocadas, o Espírito Santo vai ganhar, caso a proposta seja aprovada também no Senado e sancionada pelo Governo, maior recuperação da cobertura florestal, principalmente em relação às Áreas de Preservação Permanentes (APP’s). Pensando nisso, o secretário de Agricultura do Estado, Enio Bergoli, afirmou que o Governo estadual vai anunciar, agora em junho, um programa estratégico de ampliação da cobertura florestal capixaba para recuperar aquelas áreas desmatadas para a realização de agricultura e urbanização desordenada.


Confira a entrevista na íntegra


Folha Vitória: Se o novo código for aprovado, o que muda aqui no Espírito Santo?


Enio Bergoli: Mesmo com várias polêmicas e interpretações equivocadas sobre o texto que foi aprovado na Câmara Federal, afirmo, tecnicamente, que aqui no Espírito Santo teremos uma recuperação da cobertura florestal, principalmente no que se chama de Áreas de Preservação Permanente (APP´s), que são as margens de rios e córregos, entorno de nascentes, lagos e barragens, além das encostas íngremes e topos de morro. É importante esclarecer que nosso Estado está sob os efeitos da Lei da Mata Atlântica que proíbe qualquer tipo de desmatamento, de supressão vegetal. Além disso, haveria uma recomposição da reserva legal para os médios e grandes produtores. A reserva legal é um espaço da propriedade que deve ser protegido com espécies arbóreas e nativas, permitindo sistemas agroflorestais e agroecológicos.


FV: Que projetos o Governo tem para essas áreas de proteção caso o código seja aprovado?


EB: Neste início de Governo, as equipes das secretarias de agricultura e de meio ambiente avaliaram os diversos projetos em curso com vista à recuperação ambiental e ampliação da cobertura florestal, como o Campo Sustentável, Florestas Piloto, Extensão Ambiental, Florestas para a Vida, Proteção de Nascentes, dentre outros. Neste mês de junho, o governador Renato Casagrande anunciará um amplo programa estratégico de ampliação da cobertura florestal do Espírito Santo, que organizará e contemplará todas essas iniciativas, além de outras. Temos no Governo do Estado uma leitura muito clara que ao longo de décadas avançou-se além do suportável, do sustentável, na abertura de áreas nativas para se fazer agricultura e outros fins, como a própria urbanização.


FV: A maioria dos produtores capixabas é de pequeno porte, de que forma eles seriam impactados pelo novo código?


EB: Basicamente, os pequenos agricultores que possuem área até 4 módulos fiscais, algo entre 60 e 100 hectares para a maioria dos municípios capixabas, estariam dispensados de fazer a recomposição da Reserva Legal, que pela legislação deve corresponder a 20% da área total da propriedade, aqui no Espírito Santo. Porém, quem já tem reserva legal, em maior ou menor percentual, não poderá desmatar. O texto aprovado na Câmara ainda permite o Uso Consolidado, ou seja, a presença de agricultura em áreas de APP´s. Contudo, o uso consolidado deverá ser submetido a critérios rigorosos de regulamentação. Esses critérios levarão em conta a inexistência de risco para os recursos hídricos, para o solo e que garanta a proteção e a qualidade dos recursos hídricos. No caso de APP´s, o texto não diferencia obrigações para pequenos e grandes produtores.


FV: Existe um número de quantos produtores capixabas se enquadram na anistia dada pelo Governo Federal em 2008. Como a secretaria trabalha com esse debate de ampliar o prazo para que produtores que desmataram tenham prazo maior para reflorestar as áreas prejudicadas?


EB: Estamos ainda finalizando esses números. Registro que esse termo anistia é um dos grandes pontos polêmicos nesta discussão do novo Código Florestal Brasileiro. A imensa maioria dos agricultores desmatou ao longo dos anos e das décadas de acordo com a lei vigente à época, e com fartos incentivos públicos. Há um outro grupo muito menor, que desmatou à margem da Lei e que devem sofrer todos os rigores da Lei. Portanto, o tratamento deve ser diferenciado para os dois grupos. E, ao meu juízo, é muito mais importante para a sociedade a efetiva recuperação da cobertura florestal do que um simples recolhimento de multas. Assim, é razoável se conceder incentivos públicos para a ampliação da cobertura florestal para quem não cometeu ilegalidade e conferir todo o rigor público para quem infringiu a Lei. No Senado Federal poderá ser aperfeiçoado.


FV: De que forma o novo código impacta nas discussões de instalações de novas plantas industriais no Espírito Santo?


EB: Como já disse, aqui no Espírito Santo estamos submetidos à Lei de Mata Atlântica. Somente é permitida a supressão de árvores nativas em casos muito especiais, como ações de interesse público e social, devidamente autorizadas pelo órgão ambiental e acompanhadas de ações mitigadoras. Mas o fato é que já temos áreas abertas, desmatadas, em demasia. E não será necessário derrubar uma árvore sequer por aqui para se fazer agricultura, empreendimentos industriais e demais formas de ocupação do solo. Precisamos sim, é iniciar uma ampla recomposição florestal que trará benefícios para todos e, portanto, não é justo, que somente os agricultores paguem essa conta.


FV: E como conciliar essa questão do desenvolvimento com o equilíbrio ambiental?


EB: Esse é um grande desafio que inclusive o chamado primeiro mundo não conseguiu superar, em termos de cobertura florestal. Apesar de tudo, nosso país ainda tem 61% de cobertura florestal nativa, enquanto na Europa há apenas 0,3%. Acredito muito na boa ciência e na socialização e universalização dos conhecimentos e tecnologias gerados pelas instituições de pesquisa e pela academia. Com efeito, vamos produzir muito mais alimentos, fibras e energia a partir da agricultura, por meio de boas práticas agrícolas, utilizando-se muito menos área. E é justamente essa “sobra” de área que será fundamental para avançarmos na recuperação ambiental, vez que somente a preservação já não é suficiente. Essa é a solução para se evitar os radicalismos que não levam a lugar nenhum. É nocivo para a sociedade tanto o radicalismo do ruralismo arcaico quanto o do ambientalismo dissociado da realidade.


 


Folha Vitória

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