
Em novembro será lançada a primeira “versão beta” do projeto de mapeamento de uso e cobertura do solo no Espírito Santo. O estudo, conduzido por fotointerpretação e inteligência artificial, tem o café, o cacau e a silvicultura como foco principal. A pesquisa surgiu em 2023, em resposta à necessidade de segurança jurídica referente às exigências da legislação da União Europeia, quanto à transparência e sustentabilidade nas áreas de produção livres de desmatamento.
A pesquisa é uma parceria entre Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) – Campus Alegre, Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper) e Secretaria Estadual de Agricultura.
A iniciativa começou após análises pela Ufes da auditoria que a União Europeia pretendia utilizar, onde os pesquisadores apontaram inconsistências no sistema utilizado para monitorar áreas de desmatamento em regiões de floresta tropical úmida, incluindo o Brasil e, mais especificamente, o Espírito Santo. A legislação conhecida pela sigla EUDR, trata de uma política verde que, a partir de 2020, impede a entrada de commodities agrícolas e florestais provenientes de áreas desmatadas, informou o professor e pesquisador da Ufes, Samuel de Assis Silva, um dos coordenadores do projeto.
Utilizando modelos avançados de mapeamento, foi desenvolvido um sistema de Inteligência Artificial, inspirado na metodologia do sistema de auditoria europeu, denominado Tropical Moist Forests (TMF). O pesquisador afirma que foram identificadas inúmeras inconsistências na avaliação da UE e elaborado um relatório técnico enviado à Embaixada do Brasil na Inglaterra, chegando até as instâncias da Câmara Internacional de Comércio com Café.
“O relatório elaborado no Laboratório de Mecanização e Agricultura e Silvicultura de Precisão e Digital (LabMAP) da Ufes, substanciado com robustez e confiabilidade científica, derrubou o mecanismo de auditoria da UE e se tornou um projeto de grande magnitude que trará relevância política e econômica e, principalmente, diplomática para o Estado. Mas, o principal: vai dar segurança aos agricultores que trabalham dentro dos limites da legalidade, no que diz respeito às políticas ambientais, em especial livres de desmatamento”, detalhou o pesquisador.
Agência internacional abraça projeto
Reconhecendo a relevância do projeto, a Organização Internacional Ítalo-Latino Americana (IILA), após contato com a Secretaria de Agricultura do Estado do ES, aportou recursos da ordem de R$ 3,5 milhões de reais, administrados pela Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes), para a realização do mapeamento completo do uso e cobertura do solo capixaba. Para isso, o Estado foi dividido em duas partes: a Ufes ficou responsável pelas regiões central, serrana e sul, enquanto o Incaper com a norte.

Os dados da primeira versão do levantamento serão incorporados à plataforma “Selo Verde”, uma parceria entre os governos do Espírito Santo e Minas Gerais, a partir do mês que vem.
“Os dados são os polígonos mostrando as áreas de produção do Estado. Isso permitirá fazer o histórico de evolução do uso em cobertura do solo, em virtude dessa imposição legal estabelecida pela UE, gerando conformidades no que diz respeito à segurança ambiental e à sustentabilidade das áreas de produção. Além disso, permitirá aos agricultores acesso, de forma gratuita, a uma base pública com atualizações semestrais, acompanhando ao longo dos anos a evolução do uso e cobertura do solo”, comentou.
No ano que vem também serão realizadas incursões de campo para validar o levantamento feito com inteligência artificial. “A intenção é oferecer um sistema com precisão cartográfica, onde eu consiga delimitar, por exemplo, um talhão de uma propriedade produtora de café, inclusive separando se é arábica ou conilon, de acordo com a característica espectral de cada um desses alvos. Se eram áreas de vegetação natural que foram convertidas em áreas de produção, ou se já eram áreas de produção que permaneceram como áreas de produção”, frisou o pesquisador da Ufes.
O produto será atualizável e em curto espaço de tempo. O último lançamento está previsto para o ano que vem e, nesta etapa, o projeto recebe aporte da Secretaria Estadual de Agricultura do ES. “Estamos incorporando também uma parceria com a Conab, usando a base que estamos construindo para auxiliá-la na previsão de safra de café para o ES. Vamos adicionar, além da separação do café arábica e conilon, as lavouras que estão em formação e as que estão em produção”, relatou.
Importações em jogo
Para as importações, o projeto tem apelo político, econômico e diplomático, mas, principalmente social, já que a maior parte dos agricultores do Estado, como os cafeicultores, são de pequeno porte e uma parcela significativa é de base familiar, podendo ser impactados diretamente pela impossibilidade de exportação, informou o pesquisador da Ufes.
“O agricultor não necessariamente é um exportador, mas o exportador sendo penalizado, indiretamente compromete a produção daquele pequeno agricultor, pois o café dele não poderá mais ser vendido para o exterior. A tendência é que essas políticas ambientais cresçam em volume, mas também em disseminação para o mundo inteiro, afetando até mesmo o nosso mercado interno a respeito da comercialização”, ponderou o professor Samuel.
Valda Ravani – Jornalista, Redação Campo Vivo

