Cancro dos ramos do cafeeiro desafia produção e longevidade de lavouras no ES

Pesquisas da Ufes Campus Alegre apontam diagnóstico precoce e manejo integrado entre as medidas para evitar que 100% da lavoura seja erradicada

por Portal Campo Vivo
Café acometido pelo cancro dos ramos do cafeeiro, popularmente conhecido por fusariose. Foto: divulgação Ufes Campus Alegre

O cranco dos ramos do cafeeiro, conhecido por fusariose, se tornou umas das principais ameaças às lavouras capixabas. A Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Campus Alegre, tem avançado nas pesquisas buscando soluções e ferramentas que proporcionem longevidade da lavoura. Os estudos apontam que o uso de mudas sadias e clones resistentes, a eliminação de plantas com sintomas iniciais e o controle biológico são fundamentais para o manejo, já que a doença é de difícil controle e pode erradicar até 100% da lavoura, se não manejada.

O Fusarium sempre esteve presente no Estado, mas foi em 2015, na cidade de Jerônimo Monteiro, no Sul, que a doença foi identificada da forma que vem avançando sobre as lavouras de canéfora (conilon e robusta).

No mesmo ano, a instituição iniciou pesquisas para compreender o manejo da doença, que, segundo Willian Bucker Moraes, Mestre em Produção Vegetal, Doutor em Proteção de Plantas (Fitopatologia), professor e pesquisador da Ufes, foram intensificadas em 2024, quando firmada parceria com o Programa de Incentivo à Pesquisa, à Extensão, ao Desenvolvimento e à Inovação Agropecuária (Inovagro), com o projeto: Epidemiologia e manejo do Cancro dos Ramos do Cafeeiro (Coffea canephora).

“Até agora identificamos as espécies Fusarium solani, F. decemcellulare, F. lateritium , mas pode ser que existam outras espécies associadas. O maior impacto da doença hoje é a mortalidade das plantas. Hoje temos registros de redução em torno de 50% da produtividade, mas esse número pode chegar a 100%. Com relação ao fruto, precisamos avaliar a bebida, mas com certeza causa impacto negativo, por ser um fungo que faz perder em qualidade”, relata o especialista.

O manejo do cancro dos ramos é desafiador e exige estratégias integradas. Uma vez instalada, dificilmente o fungo será erradicado totalmente da área, afirma o pesquisador, pontuando que não existe um método único capaz de resolver o problema. O produtor precisa associar ferramentas para reduzir a mortalidade, aumentar a produtividade e manter a longevidade da lavoura.

“O primeiro ponto é identificar o que está causando o problema para monitorar e implementar práticas de manejo. O quanto antes eliminarmos a planta doente da lavoura, menos patógenos, ou seja, menos fungos teremos. Temos casos de lavoura de conilon que com três anos foram renovadas, pois a doença veio pela muda e o produtor não conseguiu conduzir”, alerta Moraes.

Willian Bucker Moraes, Mestre em Produção Vegetal, Doutor em Proteção de Plantas (Fitopatologia), professor e pesquisador da Ufes. Foto: divulgação

Plantas mais vulneráveis e disseminação por mudas

A substituição de plantios canéfora (conilon e robusta) feitos a partir de mudas produzidas com sementes (com maior variabilidade genética), – como acontecia no passado -, por clones (geneticamente idênticos) resultou na redução da variabilidade genética e aumento da suscetibilidade das lavouras.

“Esse processo favoreceu a ocorrência da doença, e, além disso, muitos produtores começaram a plantar mais de 50% de um único clone em uma mesma área. Houve, assim, uma pressão de seleção, e aquela doença que então matava uma planta ou outra, começou a matar mais”, informou o professor Willian Bucker Moraes.

Outro fator preocupante é a disseminação do fungo por meio de mudas contaminadas. O uso de mudas de viveiros não registrados, sem jardim clonal ou sem o devido controle fitossanitário, tem contribuído para a introdução da doença em áreas antes livres do patógeno. “É fundamental que o produtor compre mudas de viveiros registrados no Mapa e com jardim clonal para evitar levar a doença para dentro da propriedade”, reforça.

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Pesquisas em andamento

Com apoio do Inovagro e parcerias com instituições como Incaper/Embrapa e Ifes, a Ufes Campus Alegre está conduzindo, diversos estudos, entre eles a avaliação da resistência  de 75 clones ao cancro dos ramos do cafeeiro.

Além disso, pesquisas da universidade apontam que o controle biológico tem mostrado importantes resultados.  Bacillus  e Trichoderma, quando posicionados nas épocas corretas, têm permitido que as plantas reduzam mortalidade e produzam. Associado a isso, no que tange o controle químico, moléculas altamente eficazes (análises in vitro e campo) também têm mostrado bons resultados.

“Como o café é uma cultura perene é necessário observar os resultados ciclo após ciclo, colheita após colheita, para analisar se esses resultados vão se manter”, destacou o pesquisador.

Como identificar o cancro dos ramos

A identificação precoce da doença é essencial para evitar a sua disseminação. Os sintomas começam com a perda de dominância apical – a ponteira da planta fica mais baixa -, os ramos laterais vão passar a ponteira, havendo a curvatura da folha e, logo em seguida, ocorre murcha, amarelecimento e a formação de cancros nos ramos centrais (ortotrópicos) e laterais (plagiotrópicos) do café. O fungo bloqueia o sistema vascular da planta, interrompendo o fluxo de água e nutrientes na planta.

Uma das principais diferenças em relação à fusariose do tomate, por exemplo, que é confundida pelos produtores, ressalta o especialista, é que, no café, a doença se dissemina também pela parte aérea da planta – e não apenas pelo solo. Isso significa que o manejo inadequado durante a colheita ou outros tratos culturais podem espalhar o patógeno por toda a lavoura, agravando o problema a cada ciclo produtivo.

Impacto econômico

O cancro dos ramos causa impactos significativos na cafeicultura. Lavouras que produzem até 10 anos, se acometidas pela doença, podem ser renovadas antes do sétimo ano, e em alguns casos, plantações com apenas três ou quatro anos precisaram ser erradicadas. “Quando a doença se instala cedo, muitas vezes a lavoura não chega a cobrir nem os custos de implantação”, aborda o pesquisador da universidade federal capixaba.

A expectativa é que, com os avanços das pesquisas e a disseminação de boas práticas entre os produtores, seja possível conviver com a doença de forma mais eficiente, minimizando perdas e preservando a produção de café no Espírito Santo. Os estudos seguem até 2027, podendo ser renovado, conforme edital. Os resultados da pesquisa estão sendo divulgados conforme conclusão das etapas do projeto.

Inovagro, programa de incentivo que apoia a Ufes na pesquisa, é uma iniciativa do Governo do Estado do Espírito Santo, em parceria com a Secretaria da Agricultura, Abastecimento, Aquicultura e Pesca (Seag)e a Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

Valda Ravani, jornalista, Redação Campo Vivo

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