Matéria publicada na Revista Campo Vivo – ESPECIAL CAFÉ (Edição 46 – Julho 2021)
Abelhas na lavoura de café: por que adotar essa estratégia?
Se alguém chegar pra você um dia e te perguntar qual associação existe entre abelhas e uma lavoura de café, tenha a resposta na ponta da língua: auxiliar na produtividade da lavoura. Sim, essa associação tem sido uma verdadeira arma secreta para impulsionar ainda mais os resultados nas lavouras de café de alguns produtores do Norte do Espírito Santo.
Esse é o caso da propriedade de Eduardo Bortolini, na região de Chapadão em Linhares. Trabalhando com essa técnica desde 2017 quando firmou uma parceria com o engenheiro agrônomo e apicultor Fábio Moura Passos, Eduardo viu essa junção agilizar ainda mais o processo de polinização do café na sua propriedade. “Temos estudos e pesquisas aprofundadas sobre essa polinização cruzada gerando uma interdependência da abelha. E essa é uma parceira muito interessante e que tem dado certo na fazenda. Nós oferecemos o pólen e o néctar da propriedade pra abelha se alimentar, e o apicultor traz as abelhas para fazer essa polinização cruzada do café conilon, o que traz mais agilidade no processo de polinização e melhores resultados já que a abelha é uma grande agente polinizadora. Fornecemos o alimento pra abelha, que fornece alimento para nós humanos”, diz Eduardo.
Fazendo essa polinização de maneira adequada, já que é preciso ter cuidado ao utilizar as abelhas na lavoura para não modificar a rotina da propriedade, não trazer risco aos trabalhadores, o resultado é certo, seja ele na qualidade dessa florada, como também na produção e ainda na melhora do tamanho do grão. “Tenho percebido que na fazenda melhorou bastante a questão da floração e a garantia de grão total. A floração tem vindo cada vez melhor do que já era”, afirma Bortolini.
Mesmo com todos os benefícios encontrados no uso das abelhas na lavoura de café, é importante deixar claro que o produtor que deseja começar usar dessa técnica na sua propriedade, procure um apicultor que realmente saiba realizar o trabalho para não ter problemas maiores especialmente em relação aos cuidados necessários com o manuseio das abelhas. “Quando vou na propriedade levar minhas colmeias para fazerem o trabalho, não é de qualquer jeito. É preciso saber onde soltar essas abelhas, quais os locais mais adequados, para que isso não implique em riscos para o produtor e os trabalhadores daquela fazenda e nem atrapalhe nos cuidados diários da terra. Por isso sempre gosto de alertar sobre a importância de ter alguém que saiba manusear corretamente esses insetos, alguém que tenha expertise no assunto. Não adianta sair comprando abelhas por conta própria sem saber como utilizá-las de maneira correta e segura”, ponderou Fábio.
O principal trabalho dessas abelhas na lavoura é visitar as flores para fazer a polinização, e ajudar que mais flores vinguem e tragam melhores resultados finais. Geralmente as abelhas ficam nas lavouras do início do mês de junho até novembro. “Nós alocamos quatro colmeias por hectares, essa é a quantidade ideal. Cada abelha visita, em média, 10 flores por dia. Cada colmeia tem em média, 60 mil abelhas. Então 60 mil abelhas visitando 10 flores por dia, dá um total de 600 mil flores visitadas por dia, por colmeia. Então se o produtor tiver 40 colmeias trabalhando o tempo todo, o aumento de flores visitadas é enorme, e isso acaba fazendo com que mais flores virem grãos”, detalha o apicultor.
O Presidente da Federação dos Apicultores do Espírito Santo (FECAPIS), apicultor e consultor técnico em Apicultura, Arno Wieringa, explicou que as abelhas transferem os grãos de pólen entre diferentes estruturas das flores, gerando frutos e sementes, e que não apenas elas podem realizar a polinização, mas qualquer outro agente polinizador, como aves, borboletas, vespas, e outros seres vivos que visitam flores como fonte de alimento. “Porém, as abelhas são os agentes mais adaptados, mais eficientes e, portanto, os mais importantes no processo de polinização, havendo grande interdependência entre espécies de plantas e seus respectivos polinizadores, que podem ser únicos. Sabemos que o café (principalmente o arábica) consegue produzir frutos e sementes sem a presença de abelhas e outros polinizadores. Porém estudos científicos comprovam que a presença de abelhas no entorno das lavouras de café, contribui com um aumento da produtividade”, pontuou.
Dados apontam que esse processo aumenta em 15% e 20% o rendimento da florada, elevando a produção do café. Além de todos os benefícios em relação à produtividade, a promoção da polinização gera benefícios diretos e indiretos para todo o agronegócio e meio ambiente, como a produção ecologicamente sustentável, a relação de ganhos mútuos entre produtores agrícolas e criadores de abelhas e ainda a redução da mortandade de abelhas por uso indevido de defensivos agrícolas.
Arno e André Lopes que também faz parte da FECAPIS já trabalham com abelhas há mais de 20 anos, sendo os últimos cinco anos voltados para a relação das abelhas polinizadoras com a cafeicultura. Eles acompanham pessoalmente os trabalhos e pesquisas recente com manejo de abelhas para polinização nas lavouras da região Norte do Estado que produzem café e destacam que essas pesquisas, no qual uma parte ainda está em andamento, tem o intuito de verificar se há ou não acréscimo de produtividade caso haja mais abelhas do que as naturalmente distribuídas no ambiente, ou seja: com polinização dirigida versus abelhas do ambiente. Os pesquisadores recomendam que os próprios cafeicultores façam a experiência em suas propriedades, colocando colmeias de abelhas em uma parte e comparando com outros talhões na fazenda. “Orientamos que os produtores façam dessa forma pois assim poderão “ver com os próprios olhos” quais resultados conseguem obter, qual melhor se adequa em sua realidade e lavoura”, pontuou Arno.
Os consultores destacam ainda a importância de existir um bom relacionamento e diálogo entre cafeicultor e o criador de abelhas. “Antes de iniciar os trabalhos de polinização, é importante planejar as ações, saber a hora certa de colocar e retirar as colmeias, o andamento da colheita, a aplicação das boas práticas na hora do uso de defensivos agrícolas para que juntos avaliem os resultados obtidos e, se necessário, façam os devidos ajustes já pensando na próxima safra. Então é por isso que é importante esse contato contínuo e o bom relacionamento entre o apicultor que fornece seu trabalho e o produtor que recebe”, frisou Wieringa.
Linhares amplia implantação de colmeias nos cafezais
Em Linhares, a Secretaria de Agricultura tem trabalhado para expandir essa parceria entre cafeicultores e apicultores para potencializar a polinização das flores do café, por meio da instalação de colmeias dentro dos cafezais.
Na primeira etapa as localidades a receberem as caixas serão: Desengano, Quartel de Cima, Farias, Córrego Dr. Jones e região de Japira. As áreas definidas para receber foram as que possuem, conforme mapeamento da Secretaria de Agricultura, maior concentração de cultivo de café no entorno, haja visto que a abelha tem capacidade de polinizar as flores do café em até 2 km do raio de sua casa (caixa).
“Promovemos o diálogo com apicultores que praticam a apicultura migratória, aquela em que na época da florada do café, como é o caso, são colocadas as colmeias em algumas áreas, e também já mapeamos com os agricultores as áreas que receberão essas colmeias no município. Linhares está com a produtividade média de café conilon acima da média estadual, mas podemos evoluir mais, melhorando os indicadores de produção e essa é uma ação eficaz neste sentido”, afirma o secretário municipal de Agricultura de Linhares, Franco Fiorot.
Quem está satisfeito com a iniciativa é o cafeicultor Robson dos Reis Silva, de Córrego Doutor Jones. “Esse é um projeto novo na minha região. Estamos animados para receber as caixas com as abelhas que são extremamente importantes no processo de polinização e que acredito que vem para contribuir na melhoria da nossa produtividade”, disse o agricultor.
A instalação de colmeias dentro de cafezais em Linhares é iniciativa que faz parte do Programa Municipal de Qualidade do Café Conilon.
Redação Campo Vivo