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Na comunidade de São Jorge da Barra Seca, no município de São Mateus, pai e filho andam pelas linhas do cafezal. Há mais de 40 anos, o produtor Lucas Riguetti está na propriedade cultivando café. Agora conta com a ajuda do filho Wagner para conduzir a atividade unindo experiência com inovação em tecnologia. Os avanços permitiram que a produção saísse de 250 sacas no início para as 1.700 colhidas em 2014 em 60 hectares. E para atender a expectativa de continuar evoluindo na produtividade, os cafeicultores inovaram com a mecanização da colheita, tendência da atividade devido a dificuldade de mão-de-obra, e, na última safra, utilizaram apenas 30% de funcionários comparado aos anos anteriores.
Mas a produtividade por aqui é apenas uma das metas da família que tem um cuidado especial com outro aspecto da produção cafeeira. “O que eu quero pra mim tenho que fazer para os outros. Principalmente na alimentação”, diz seu Lucas Riguetti, mostrando o zelo pela qualidade dos grãos produzidos. Para atingir esse patamar desejado, o produtor segue as recomendações no processo de produção e o foco é na hora da secagem. Para isso, construiu um terreiro de cimento com estufa, um dos pioneiros da região. A estufa, além de possibilitar maior temperatura e secagem mais rápida do que terreiro a céu aberto, evita que os grãos sejam molhados pela chuva. “Esse é o grande diferencial. O grão não pega umidade”, diz Lucas. Mas o trabalho é caprichado para alcançar bons níveis de qualidade.
Após colher, o produtor leva logo para o terreiro, espalha em uma camada não muito grossa e mexe o café, em média, a cada hora. O processo dura cerca de seis dias. Os lotes da produção que são secados desta maneira conseguem valor superior no mercado e reconhecimentos. Em 2007, Riguetti foi o vencedor o Concurso Conilon de Excelência da Cooabriel, cooperativa agrária de cafeicultores de São Gabriel da Palha, com atuação no norte capixaba, concurso que ele participa desde a primeira edição em 2003 quando ficou em décimo primeiro lugar. “De lá pra cá fomos tentando melhorar. Antes nem irrigação tinha. Melhoramos adubação com apoio técnico. E tenho muito cuidado com a produção”, diz o pai sendo confirmado pelo filho. “Até lavar o terreiro antes de secar ele lava”, conta Wagner.

Qualidade no café com cooperação de pai pra filho
O mesmo concurso de qualidade reconheceu, no ano passado, o trabalho de um produtor de base familiar da localidade de Córrego da Prata, em São Gabriel da Palha, que alcança elevada qualidade nos grãos produzidos mesmo com realidade diferente. Trabalhando somente com a família, sem máquinas e com extrema dificuldade de recursos hídricos para a lavoura, o agricultor Paulo Sérgio Canal foi o vencedor do concurso em 2014 na categoria natural. O diferencial, segundo ele, foi no manejo com o monitoramento da broca-do-café, colhendo grãos de acordo com fase de maturação na lavoura resultando, no final, em colheita de 90 a 100% do café maduro. Depois, levado ao terreiro e ‘mexido’ de quatro a cinco vezes ao dia e somente coberto após atingir a ‘meia seca’. “Isso evita fermentação e mofo, essencial para ter qualidade”, diz Canal. Outro fator chama atenção no cuidado do produtor com a atividade. Terminada a colheita, ele utiliza a palha de café espalhada no terreiro para proteger do sol e da chuva evitando erosão e rachadura no solo que, mais compacto, favorece a secagem da produção seguinte.
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Mesmo com dificuldade hídrica e sem uso de máquinas, Paulo Canal alcançou elevados indíces de qualidade
Mas os grãos da safra seguinte só aparecem porque o produtor teve que buscar alternativas para irrigar a lavoura. Com a falta de recursos hídricos na sua localidade e impossibilidade de captações, Paulo Sérgio aproveitou as cisternas que tem em casa, fruto de um programa federal passado, e fez um sistema para aproveitar a água da chuva nos reservatórios. “Isso que garantiu a produção que tive esse ano. Caso contrário não tinha nada”, afirmou o cafeicultor que vive desde os três anos de idade no mesmo local e diz que tem sempre que ‘aprender a inovar diante das dificuldades do campo’.
A sustentabilidade na agricultura está sendo incentivada em vários frentes e, neste ano, será critério de avaliação adotado pela organização do concurso de qualidade conilon da Cooabriel. De acordo com o gerente geral da cooperativa, Edmilson Calegari, havia uma visão de que os envolvidos na atividade do café arábica praticavam essa busca por qualidade e tinham uma valorização por isso. “Vimos a necessidade da melhoria da qualidade do conilon e não só produtividade. Existem vários processos na melhoria de qualidade que possibilita um valor agregado aos produtores. Por exemplo, colhendo o café com o máximo de maturação possível haverá maior rendimento em peso. Melhorando a qualidade da bebida sempre haverá mercado enquanto cafés piores tem momento que não consegue”, explica o gerente.
Pioneiro no Espírito Santo, o concurso avalia, em análises físicas e sensoriais, critérios como cor, uniformidade, umidade, defeitos, aroma, bebida, entre outros. A iniciativa tem dado resultado. “No passado recebíamos cerca de 30% a 40% de café de boa qualidade, de tipo 7 pra melhor, hoje estamos com 75% a 80% desse tipo de café em nossos armazéns. Teve um evolução de qualidade significativa”, diz Calegari, que participou da idealização e construção do regulamento há doze anos.
De olho no mercado de cafés, a qualidade dos grãos começa a ser fator básico para alguns mercados. A exigência do consumidor está criando novos padrões na alimentação e, por ser um alimento, o café está inserido nessa demanda. A qualidade é percebida como sabor gostoso que permanece na boca, aroma agradável e consistente. O consumidor esta melhorando a sua percepção sobre a qualidade e as diferenças entre cafés. Os cafés tipo Gourmet, pouco conhecidos até poucos anos, já são identificados por 37% dos consumidores, sendo que 51% da classe A responde que conhece e aprecia cafés Gourmet. Além disso, 44% do público responde que estaria disposto ou muito disposto a pagar a mais por estes cafés, desde que reconheçam uma qualidade superior.

Exigência do mercado faz com que cooperativa incentive qualidade no café conilon
Segundo o vice-presidente da Cooabriel Luis Carlos Bastianello, após evoluir em produtividade, o grande desafio do setor está sendo evoluir na qualidade dos grãos. “Estamos nesse trabalho intenso de passar ao produtor a percepção da necessidade da qualidade do café, que está concentrada no manejo correto pós-colheita, em cuidados simples, mas que fazem a diferença. Quando começamos a falar em qualidade do conilon isso era impensável, hoje já temos café para comercializar com 100% conilon e ótima bebida. O mercado está exigindo e estamos incentivando essa produção”, finaliza Bastianello.
Franco Fiorot