A floração vem sendo satisfatória na maioria das regiões produtoras de arábica do Brasil e o mesmo aconteceu com o conilon anteriormente. Seria esta uma indicação de uma colheita gigante? O que aconteceu após a floração nos últimos dois anos – seca no período de desenvolvimento das cerejas – indica que talvez seja muito cedo para tal conclusão. Mas antes de entrarmos neste assunto, vamos rever o que aconteceu de 2013 até hoje.
O Brasil teve uma temporada de floração típica ou normal em 2013 mas a produção foi frustrada pela seca de janeiro a março de 2014 que impediu muitas cerejas de se desenvolverem em grãos viáveis e causou, consequentemente, perda de peso. A floração em 2014 foi menor que o usual devido ao déficit hídrico sofrido pelas plantas já afetadas pela grande carga que suportaram. Era esperado que as cerejas resultantes produziriam grãos de tamanho normal, mas agora sabemos que uma breve seca em janeiro de 2015 afetou o tamanho de peneira mais do que esperado. O que aconteceu nas safras de 2014 e 2015 leva à conclusão de que mais do que nunca, qualquer previsão de safra no Brasil precisa levar em conta a precipitação no período de formação e desenvolvimento das cerejas e que a quantidade de chuva esperada pode diminuir como resultado de mudanças climáticas. Em outras palavras, a prática de associar diretamente boa florada com grandes safras pode estar se tornando uma grande simplificação.
Todos nós envolvidos no agronegócio café lemos e ouvimos muito sobre mudanças climáticas desde que a seca de 2014 atingiu áreas brasileiras produtoras de café. Resumo aqui três versões diferentes sobre a seca de 2014: (1) foi um fenômeno isolado, com poucas chances de acontecer novamente, (2) foi parte de um padrão recorrente de secas que acontece a cada tantas décadas ou (3) foi o início de um novo padrão que acontecerá frequentemente. Não importa qual teoria prevaleça – e apenas o tempo mostrará – é fato que houve uma seca pequena em 2015 e as temperaturas foram mais altas do que as médias históricas. Isto introduz um novo fator paraprevisão de safras: a temperatura.
Temos evidência de que mesmo áreas irrigadas perderam produção devido a temperaturas anormalmente altas no período de desenvolvimento das cerejas em 2014. Temperaturas extremamente altas podem fazer com que as flores não “peguem” e causar lentidão na fotossíntese com impactos óbvios na produção. As temperaturas estão certamente acima da média no presente período de floração no Brasil, e se aproximando agora de níveis extremos.
A mudança climática é um fato, e deve-se levar a floração em consideração como primeiro fator crítico para previsão de safra. Mas para que a florada se converta em safra são necessárias chuvas em volume suficiente para fazer com que as flores produzam fruto e que tais frutos se desenvolvam e as temperaturas devem estar em níveis que não coloquem a florada ou o desenvolvimento das cerejas em risco. Com isto em mente, a atenção do mercado deve ser focada em dois “períodos de controle”: o período de floração, de setembro a novembro, e o período de crescimento dascerejas, de janeiro a março, com temperaturas e chuvas monitoradas durante e além de tais períodos. Talvez prever safras tenha sido uma tarefa mais fácil no passado…
Por último, mas não menos importante, ferramentas de mitigação das mudanças climáticas existem – irrigação, sombreamento, plantio profundo, novas variedades, etc. – e outras serão criadas mas aparentemente, os países produtores mais competitivos, por exemplo, os mais avançados tecnologicamente e com cadeias de abastecimento melhor organizadas dentro e fora da fazenda, são os que se adaptarão melhor e mais rapidamente às mudanças climáticas e se tornarão ainda mais competitivos do que são atualmente. Isto não deveria ser uma surpresa já que estes países concentram a maior parte da pesquisa em café e tem os sistemas de extensão rural e financiamento mais avançados, para citar apenas alguns fatores. A tendência atual dos maiores países produtores de café aumentarem sua fatia de mercado será provavelmente intensificada pelas mudanças climáticas.
por Carlos Henrique Jorge Brando