Café não pode ser tratado como commodity, diz presidente da Illy

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Andrea Illy

O setor cafeeiro tem de parar de tratar o café como uma commodity se quiser garantir a sustentabilidade da atividade no futuro, na avaliação do presidente da Illycaffé, Andrea Illy. Além disso, a produção de grãos precisa receber três vezes mais investimentos do que tem sido aplicado atualmente, uma análise que foi compartilhada por outros representantes de empresas durante o painel “Promovendo uma produção competitiva e sustentável”, que abriu o 1.º Forum de CEOs e Líderes Globais, realizado pela Organização Internacional do Café (OIC), em Londres.

“Se você quiser ser algo no futuro, pare de ‘commoditizar’ o café”, afirmou, lembrando que a crise aguda do setor, com preços em queda, já é a maior em 10 anos, e salientando que há três décadas os grãos têm se transformado em simples produtos padronizados. “Nossa recomendação é tratar isso como uma estratégia de longo prazo para criar valor.”

No evento, que busca contribuições de todas as áreas do setor para a crise dos preços, o executivo disse que não é questão de “culpar” os torrefadores pelo mau momento. Ele considerou que é preciso fazer o consumo crescer ainda mais nos próximos anos, o que poderia ajudar os produtores. Illy citou que o café passou, além do prazer da bebida, a ser um ingrediente que torna o ser humano mais longevo e também a ser conhecido como um segmento mais inclusivo e sustentável, o que vem criando uma percepção positiva. “Isso é o que faz o consumo crescer”, avaliou.

No mesmo evento, a diretora de compras e vice-presidente sênior da Starbucks , Kelly Bengston, ressaltou o trabalho da rede de cafeterias em relação à proximidade com a origem de sua matéria-prima. “Temos 100 milhões de clientes por semana que buscam por café de qualidade”, disse. “Por isso, o apoio aos produtores é algo tão ligado ao nosso negócio.”

Propostas contra a desvalorização do café
Além de ressaltar a necessidade de mais investimentos na produção, o CEO da Sucafina, Nicolas Tamari, elogiou a busca por uma solução conjunta para a questão da baixa dos preços e observou que o incremento da margem entre os torrefadores é de, em média, US$ 0,10 por xícara. “Não tenho bala de prata, mas a declaração é um grande começo para tentarmos resolver a questão. Não uns contra os outros, mas em conjunto”, disse. A perspectiva é a de que, ao fim do evento, todos assinem uma declaração com propostas para tentar conter a desvalorização do café.

Além da baixa dos preços, Tamari também comentou sobre a volatilidade do setor e a dificuldade de previsibilidade para os negócios. “Meu sonho seria ter o custo de produção de cada região, a expectativa de preço de cada região e ter uma perspectiva de longo prazo.”

Tamari citou que uma das propostas dele é estimular a bancarização dos produtores. Na África, mencionou como exemplo, muitos cafeicultores vendem sua safra adiantada porque precisam de recursos para a escola de seus filhos e para outras necessidades básicas. “Então, não aproveitam bem o dinheiro. É preciso bancarizar mais produtores como esses”, sugeriu. Ele disse que em alguns dias fará, em Luanda, Angola, o primeiro pagamento digital a 240 produtores. “Queremos encorajar que outros setores ajudem nessa bancarização.”

Diferenças entre regiões
Outro painelista foi o diretor Operacional da Mercon Coffee, Juan Pablo Ibarra. Ele salientou que, apesar de o setor como um todo passar por uma crise, há muitas diferenças em relação aos obstáculos vistos nas diferentes regiões produtoras. “A realidade do Brasil não é igual à da América Central ou de outras áreas do mundo, e todo mundo tem um papel a jogar em relação aos preços. Temos de fazer a coisa certa”, disse.

Já o presidente da delegação do Conselho Nacional do Café da República de Honduras, Jacobo Paz, disse que também gostaria de ver a iniciativa privada ajudando o setor a sair da atual crise. “Temos uma crise e acreditamos que o setor privado faz parte agora desse processo de solução. Entendemos que há um mercado livre, mas, ao mesmo tempo, há mais de 200 mil famílias em Honduras que dependem do café, e que estão sufocando. Algumas delas querem abandonar as fazendas e buscar novas oportunidades”, descreveu, acrescentando que este é um problema social e que as empresas também são responsáveis por fazer mais.

“Há um fundo especial para o setor, mas ele vai apenas para América do Sul e não chega a Honduras, o maior produtor de café da América Central”, criticou. Paz relatou, ainda, que é difícil para qualquer governo tentar encontrar uma solução quando não tem dinheiro para apoiar as necessidades básicas. “Esse é um desafio. Cada dólar que estamos colocando para apoiar um produtor de café é um dólar que não vai para a Educação, e esse dinheiro é que vai para o futuro, que é voltado para as crianças, para pessoas que não estão olhando mais para as fazendas, mas para melhores oportunidades.”

Por fim, o representante hondurenho defendeu que o setor esteja mais presente na mídia, com o objetivo de atrair mais consumidores. “Temos de estar presentes na mídia. E não digo na mídia tradicional, na qual já estamos, mas na mídia que hoje é seguida pelos jovens.”

Estadão

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