Relator da ONU contra a Fome quer moratória de cinco anos para o etanol
Jamil Chade, GENEBRA
O relator da ONU contra a Fome, Jean Ziegler, acusa o Brasil de estar “desmatando a Amazônia e acabando com o Centro-Oeste” com a plantação de cana-de-açúcar para a fabricação do etanol. Ontem, em Genebra, Ziegler convocou a imprensa internacional para denunciar os biocombustíveis como uma das principais ameaças ao direito à alimentação nos próximos anos no mundo e pedir uma moratória de cinco anos na produção do etanol.
“A transformação das terras agrícolas para o cultivo de produtos que servirão para o etanol é uma catástrofe”, disse. “Até 2010, as estimativas são de que 26 milhões de hectares de terras no mundo estejam plantadas com cana, milho ou outro produto usado para a produção de etanol”, disse.
No dia 25, Ziegler apresenta à Assembléia Geral da ONU sua avaliação sobre o etanol e uma votação sobre o documento poderá ocorrer. Além disso, o relator quer que o tema seja alvo da atenção mundial no próximo dia 16, quando a ONU comemora o dia internacional do direito à alimentação.
“O etanol não gerou desenvolvimento no Brasil nos últimos 30 anos”, afirmou. O governo já havia respondido às acusações, alegando que a tese de Ziegler não era correta. “Eu insisto: o etanol gera menos postos de trabalho que a agricultura familiar. Em um país que precisa desesperadamente criar empregos, portanto, o etanol não é a saída. Estamos criando um desastre com o oceano verde de cana que está sendo plantado no Brasil”, afirmou.
O problema, segundo ele, é que essas terras deveriam ser usadas para a produção de alimentos, hoje encarecidos supostamente por conta da inflação gerada pelo etanol. “O que vemos é a possibilidade de que a fome em muitas regiões seja agravada”, disse.
A idéia de Ziegler é que, com uma moratória de cinco anos, a área plantada com alimentos não seja afetada e que, durante esse período, uma segunda geração de biocombustíveis seja criado. Segundo Ziegler, o número de famintos hoje no mundo chega a 854 milhões de pessoas. “Vinte e quatro mil pessoas morrem por dia”, afirma.
DISCUSSÃO
A polêmica sobre o plantio de cana na Amazônia ou no entorno da floresta crescerá ainda mais nos próximos meses, principalmente no Brasil. O governo federal decidiu criar um macrozoneamento agroecológico no País. O trabalho já começou e entre as missões está a de definir onde e qual a finalidade da produção de cana que ocupará a região amazônica.
Em reportagem no último fim de semana, o Estado mostrou que o plantio de cana já ocupa área de floresta no Estado do Amazonas. Apesar da pequena produção, o projeto financiado pela Coca-Cola – que compra parte da produção de açúcar do projeto Jayoro – tem conseguido alcançar sustentabilidade econômica. O governo diz que terá uma definição sobre a cana na Amazônia no segundo semestre de 2008.
O Estado de São Paulo