A suspensão das importações da UE (União Européia) da carne bovina brasileira “in natura” tende a colaborar com os índices de inflação. O mercado interno deve receber parte do volume que iria para a Europa.
Com isso, a oferta ensaia crescer, e o preço ao consumidor, diminuir. O recuo, em fevereiro e março, pode chegar a 10% em relação aos valores praticados em janeiro, disseram analistas consultados pela Folha.
Segundo a indústria, os contêineres previstos para a UE podem ser remanejados a outros destinos. Mas essa negociação demanda algum tempo.
Ainda que seja para enviar volumes maiores para outros compradores agora tradicionais da carne brasileira, como a Rússia e países do Oriente Médio. Por isso, no curto prazo, esse produto deve ser direcionado ao consumo doméstico mesmo. “O mercado deve levar até o segundo semestre para se organizar de novo”, diz José Vicente Ferraz, diretor técnico da consultoria AgraFNP.
Desde anteontem, quando a UE anunciou a suspensão das importações, o mercado pecuário praticamente travou. Os frigoríficos, puxados pelos exportadores -que prevêem amargar perdas de US$ 180 milhões pela decisão européia-, passaram a oferecer menos pela arroba do boi, diz a AgraFNP. Em São Paulo, o preço passou de R$ 74 a R$ 73,50. Em Mato Grosso e no Triângulo Mineiro, de R$ 68 a R$ 65. No Paraná, de R$ 72 a R$ 70. No Pará, de R$ 62 a R$ 60. Em Mato Grosso do Sul, as ofertas foram de R$ 70 a R$ 62. Será possível traçar tendência mais firme para as cotações apenas depois do Carnaval, diz Ferraz, da AgraFNP.
A incerteza bateu no mercado futuro, diz Mario Friuli, diretor de commodities da Link Investimentos. Outubro, contrato que capta a expectativa para a entressafra, começou 2008 em R$ 71,42 a arroba.
Chegou à máxima de R$ 74,77 no dia 16. Mas, com o embargo europeu, recuou no fechamento do mês, para R$ 70,52.
Cautela
As indústrias temem comprar boi num preço elevado pelo valor da carne que vai vender adiante, diz Péricles Salazar, presidente da Associação Brasileira de Frigoríficos.
Segundo ele, mesmo que o Brasil restabeleça o comércio com a União Européia, o volume para o bloco econômico não será igual ao do último ano, da ordem de meio milhão de toneladas. “Existe otimismo em achar que o assunto se resolve em pouco tempo”, afirma Octavio Mello Alvarenga, presidente da Sociedade Nacional de Agricultura.
Revisson Bonfim, diretor para a América Latina da Fitch Ratings (agência de classificação de risco), diz que nos últimos anos a indústria brasileira se diversificou, justamente para evitar dependência da UE.
Atacado
O movimento de baixa, acentuado pelo embargo europeu, potencializa o desempenho mais “bem comportado” que a carne bovina mostrava neste começo de ano, diz Márcio Nakane, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor da Fipe.
“Do ponto de vista do consumidor brasileiro, a situação tende a melhorar, pelo menos enquanto durar o embargo”, afirma Salomão Quadros, coordenador do IGP-M, da Fundação Getulio Vargas. Nos 12 meses encerrados em janeiro, a carne bovina subiu 23,29% no atacado e 21,86% no varejo.
Contando apenas o mês passado, no atacado houve recuo de 1,25% em relação a dezembro e alta de 1,85% no varejo. Na Grande São Paulo, o preço médio da carne desossada no atacado recuou 5% nesta semana, na comparação à anterior, diz o analista Leonardo Alencar, da Scot Consultoria. Os cortes nobres apresentaram os maiores recuos. O preço do filé mignon baixou 8,5%, para R$ 14,50 o quilo. O da picanha cedeu 17%, para R$ 17,88.
Folha de São Paulo