O mercado de crédito agrícola está com um cenário desafiador. As linhas de crédito que vêm do governo tendem a encurtar, os bancos privados se retraem e as tradings não têm mais o apetite que tinham no passado.
A Bayer, há 120 anos no Brasil e uma das principais do setor de agroquímicos, resolveu testar o setor e buscar uma forma de fornecer crédito para seus clientes.
Fez um lançamento-piloto de CRA (Certificados Recebíveis do Agronegócio) no valor de R$ 107,6 milhões.
A empresa ficou surpresa com o resultado: a demanda dos investidores foi 37 vezes superior à oferta, atingindo R$ 4,1 bilhões.
Com o sucesso do primeiro lançamento e ante a possibilidade de aumentar o crédito para distribuidores e clientes em um momento difícil do país, Matias Correch, diretor-executivo de Finanças e Administração da Bayer CropScience para o Brasil e América Latina, diz que virão novos lançamentos.
"Molhamos o dedão", diz ele sobre o lançamento-piloto. "Agora vamos começar a jogar de verdade." A demanda por crédito é alta, e a capacidade de tomada de recursos pelo agricultor no cenário atual não aponta para melhoras. Por isso, a Bayer poderá, ainda neste ano, duplicar o valor do lançamento dessa modalidade de crédito.
"O CRA é uma alternativa para aumentarmos o crédito para nossos distribuidores e clientes. Estamos permitindo que eles se autofinanciem no momento em que o crédito está escasso", diz Correch.
Ele atribui essa grande procura por esses títulos à boa rentabilidade e ao baixo risco dos papéis.
O custo financeiro fica extremamente conveniente. Produtor que compra por meio do distribuidor vai ter o benefício do CRA, que tem taxas de juros melhores.
Já os distribuidores e os clientes que fazem compras diretas da Bayer ficam devendo para o fundo do CRA, também com taxas menores.
Para Correch, um papel bem estruturado, rentabilidade boa e a Bayer assumindo o risco são a base do sucesso dessa procura.
MERCADO FINANCIADOR
A demanda por crédito deve continuar alta, e a capacidade de tomar crédito no agronegócio não dá indicação que vai melhorar, afirma.
"Idealmente, nossa estratégia é crescer mais e mais nisso para que o mercado financeiro acabe tomando o papel de financiamento. Mas o nosso papel não é o de financeira, mas investigar, pesquisar e produzir", diz ele.
Martha de Sá, sócia-diretora da Octante Securitizadora, empresa que estruturou os papéis da Bayer, diz que essa é uma nova linha de financiamento para produtores, distribuidores e cooperativas.
O lançamento da Bayer teve 1.620 participantes, dos quais o 1.602 pessoas físicas, que não pagam Imposto de Renda e IOF (Imposto sobre Operações Financeiras).
Essa procura mostra a potência desse mercado, segundo ela. A remuneração do CRA da Bayer será de CDI mais 0,29% ao ano.
O CRA é um título lastreado em créditos do agronegócio e proporciona aos clientes uma nova linha de financiamento sem usar o limite deles com os bancos e nem com a Bayer, diz Martha.
FARIA LIMA NO CAMPO
As pessoas físicas estão ávidas por por papéis bem estruturados, mas o desafio é levar o entendimento do mercado de capitais para produtores e distribuidores, algo a que não estão acostumados. "O desafio é adaptar o operacional do dia a dia à realidade de uma emissão", diz ela.
"O CRA é a Faria Lima [referência ao centro financeiro de São Paulo] indo ao campo", diz Ivan Wedekin, da Wedekin Consultoria.
A engenharia de segurança dos papéis permite que um investidor urbano financie um produtor no campo, o que ele não faria em uma operação individual, diz Wedekin.
A Bayer vende insumos, mas o produtor não consegue levantar todo o dinheiro no crédito rural e não tem capital próprio para esse pagamento. A saída é fazer dívida por meio de uma CPR (Cédula de Produto Rural), papel com a finalidade de obtenção de recursos para a produção.
Com uma operação dessa, a Bayer dá tempo para o produtor plantar e colher. Mas ela também precisa de crédito, o que consegue no mercado financeiro devido a essas operações, diz Wedekin.
Folha de São Paulo