O comércio agrícola entre países em desenvolvimento está crescendo e ganhando importância cada vez maior nas pautas de importação e exportação.
Mais de 50% das vendas brasileiras para o exterior, por exemplo, têm como destino estes países. Diante deste cenário, a Ásia surge como um grande consumidor em potencial de produtos agrícolas, não só Brasil, mas da América do Sul.
“A Ásia é prioridade número um”, acredita o diretor-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), André Nassar. Com o intuito de conhecer melhor a agricultura da Ásia e avaliar as oportunidades de negócios entre os países daquele continente e a América do Sul, o Icone está desenvolvendo, junto com a Fundação Hewlett, um projeto com o objetivo de formar uma rede de pesquisa, composta por especialistas de nove países, seis da Ásia – China, Malásia, Indonésia, Filipinas, Tailândia e India – e três da América do Sul – Brasil, Argentina e Chile.
A rede recebeu o nome de ALARN – Asia Latin-America Agri-Food Research Network – e seus estudos preliminares foram apresentados durante Seminário Internacional, realizado ontem, em São Paulo (SP). “Existe uma grande complementaridade e um potencial de crescimento de comércio entre esses dois blocos de países. É importante ter uma agenda comum para entender os fluxos de comércio e para influenciar a tomada de decisões em políticas agrícolas e comerciais desses países”, explica o pesquisador do Icone, Fábio Chaddad.
Para ele, o Brasil tem que aproveitar a chance de combinar o impressionante potencial de crescimento do agronegócio nacional, com base no aumento das exportações, com a abertura do mercado asiático. “Isso estaria diretamente ligado ao crescimento do consumo de alimentos nos países em desenvolvimento, principalmente China e India”, completou.
Dentro deste contexto, as apresentações deixaram claro que a China continua sendo – e deverá continuar assim no médio prazo – o principal mercado a ser conquistado pelo Brasil. Além de aproveitar as oportunidades, o país deve também levar em conta o grande potencial de alguns concorrentes, o principal deles a Argentina.
Importações agrícolas da China tendem a crescer
Após uma série de reformas econômicas nas últimas três décadas, o PIB chinês cresceu em uma média de 10% ao ano entre 1990 e 2006. Neste período, as importações chinesas cresceram em média cerca de 18%. No caso da agricultura, os chineses compraram mais do exterior em uma média de 13,7% ao ano, enquanto as exportações cresceram cerca de 7,5% anualmente. A partir de 2004, a China tornou-se importador líquido de produtos agrícolas e a tendência é que persista nesta posição.
“A China abriu espaço para a concorrência e deverá permanecer um importador líquido por algum tempo”, projetou o pesquisador da Universidade de Agricultura da China, Tian Weiming, alertando que o ritmo das exportações deverá continuar crescendo, ainda que em ritmo um pouco mais baixo do que o registrado nos últimos anos. “Na China, temos uma escassez muito grande de recursos naturais, como a água. Com o crescimento da urbanização e das indústrias, a disputa pela água será maior e deverá haver um deslocamento para a produção não-agrícola”, advertiu.
Para o pesquisador, a tendência da agricultura chinesa é a de cultivar mais produtos de maior valor agregado, como frutas e legumes. Com isso, o espaço para cereais e oleaginosas importados deve crescer. Os chineses também deverão investir cada vez mais no processamento dos produtos, adquirindo a matéria-prima em outros países, como já ocorre no caso da soja em grão, comprada no Brasil e em outros países e esmagada em indústrias locais.
Outro mercado com imenso potencial de consumo é o indiano. O país tem 250 milhões de pessoas mal alimentadas e uma renda per capta crescendo cerca de 6% ao ano. Para quem ganha entre US$ 1,00 e US$ 2,00 por dia – grande parte da população indiana -, aumento de renda, ainda que ínfimo, significa maior consumo de alimentos.
“Está ocorrendo na India uma mudança nos hábitos alimentares. A população está buscando produtos de maior valor agregado. Com isso, o frango tem substituído o arroz e o trigo na mesa do indiano”, destacou o pesquisador do Instituto Internacional de Pesquisa Alimentar (IFPRI), Ashok Gulati. A India é o principal importador de óleos vegetais do mundo. Os óleos comestíveis representam 48% da crescente pauta de exportação daquele país.
Em 20 anos, produção de grãos da Argentina pulou de 30 milhões para mais de 80 milhões de toneladas
As oportunidades são crescentes, mas não estão restritas ao Brasil. E, em função disso, tornam-se prioritárias medidas para amenizar os gargalos de infraestrutura e logística, que prejudicam a competitividade do país. Entre estes obstáculos, está o atraso na questão da transgenia.
E foi baseado no crescimento do cultivo de organismos geneticamente modificados (OGMs) que a agricultura da Argentina – bastante semelhante à brasileira em termos de potencial – manteve-se competitiva. No país vizinho, o agronegócio também responde por 30% do PIB nacional. Cereais e oleaginosas compõem 43% do PIB agrícola.
Apostando nos transgênicos, a área plantada no país aumentou 10 milhões de hectares em 15 anos. Mas a produção cresceu em ritmo maior. E, 1987, os argentinos colhiam cerca de 30 milhões de toneladas. Para 2007/08, a previsão é de que a safra atinja 84,5 milhões de toneladas. Entre 1990 e 2005, a produtividade da soja teve aumento de 26,4%. O milho ganhou 112% em rendimento, enquanto o trigo teve ganho de produtividade de 39,2%.
O representante da Fundação de Agronegócios e Alimentos da Argentina, o ex-secretario da Agricultura do país Marcelo Regúnaga, apresentou estudos indicando que, se o cenário é bom, as possibilidades são ainda melhores. “A produção de grãos da Argentina poderá chegar a 122 milhões de toneladas em 15 anos”, previu. Para efeito de comparação, com uma área de cultivo bem maior que a do país vizinho, o Brasil produziu 130 milhões de toneladas em 2006/07.
No período de 15 anos, o cálculo é que a safra soja argentina chegue a 55,1 milhões de toneladas, contra os atuais 42 milhões de toneladas. A produção de milho poderá pular de 16,7 milhões para 37,7 milhões de toneladas. Com isso, o saldo exportável agrícola da argentina poderia alcançar 95,2 milhões de toneladas.
Na pecuária, as projeções são ainda mais otimistas. As exportações de carne bovina dobraram entre 2000 e 2005, totalizando 596 mil toneladas. Para 2014, há potencial de um crescimento entre 148% e 235% nas vendas ao exterior, apontou Regúnaga. Na avicultura, os resultado são mais expressivos. Os argentinos pularam de 4 mil toneladas embarcadas em 2000 para 80,3 mil em 2005. Nos próximos sete anos, as exportações de frango poderão subir entre 1.027% e 1.405%.
CMA