A Sua excelência, ministra da agricultura Kátia Abreu, não honrou o histórico dos produtores rurais do País, ao apresentar uma defesa que confundiu a representação institucional do cargo que ocupa, muito em nome dos produtores que representava na CNA, com sua relação de amizade pessoal com a Dilma. Trocou, certamente, o apoio e respeito de milhares de produtores, pelo afeto pessoal à Presidente.
Sua linha de defesa, apresentada na Comissão Especial do Impeachment do Senado, tocou em três teses fundamentais:
a) A honestidade da Presidente;
b) A inexistência de empréstimo no pagamento de subvenção do crédito rural (a conhecida taxa de equalização);
c) A relevância da agricultura e a abundância da safra agrícola, como justificadoras do atraso no pagamento dos débitos da equalização.
Quanto à tese da honestidade, a Ministra saiu-se com esta: "não adiantaria nada a presidente Dilma apoiar a agricultura se ela fosse desonesta". Caramba, não está em jogo a desonestidade de Dilma, mas sim o crime de responsabilidade. Até mesmo porque, basta dizer que ela era Presidente do Conselho de Administração da Petrobras quando compraram a peso de ouro um monte de ferro velho da Refinaria de Pasadena, que nos deu prejuízos de mais de 1 bilhão de dólares. Que sua campanha de 2014 foi copiosamente irrigada com as propinas do Petrolão. Sinceramente é mais razoável acreditar em alguém, que por livre e espontânea vontade, depois de pego com a boca na botija, resolve confessar seus mal feitos e dizer os nomes dos que contribuíram e quais foram os beneficiados com as propinas, porque responderá judicialmente pelas mentiras que disser, do que acreditar que uma pessoa é honesta apenas porque sua amiga falou. Katia Abreu precisa calibrar seu conceito de honestidade com o mesmo dosador que usam os produtores.
No caso do atraso nos repasses aos agentes financeiros dos recursos para equalização das taxas de juros vis à vi os subsídios à agricultores no Plano Safra, a acusação é de que o governo deixou de repassar, a tempo, 3,5 bilhões de reais ao Banco de Brasil para pagamento de beneficiários do plano de incentivo agrícola. Com isso, o BB teve de arcar com as despesas com recursos próprios para muito depois ser ressarcido pelo Tesouro. Essa operação de crédito, já que o governo acabou por tomar um empréstimo de um banco estatal, como o BB, é proibida pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Para a Ministra, não houve operação de crédito, apenas prestação de serviços. Ocorre que os bancos, sejam públicos ou particulares, tem que evidenciar seus créditos, ou contra a receber, por obrigação contábil, e por determinação do Banco Central. Já pensou se os bancos pudessem operar com caixa 2? Fato concreto é que o Governo Federal gastou muito, gastou mal e ficou no vermelho, não podendo pagar aos bancos o diferencial de juros da conta de equalização.
Nessa linha, ao fim de 2015, por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), o Tesouro finalmente quitou 72,4 bilhões de reais das pedaladas que ainda estavam atrasadas. A principal consequência: o rombo histórico de 115 bilhões de reais nas contas do governo em 2015 (fora os déficits do GGTS, do INSS, dos fundos de pensão que tem o Governo como gestor dominante desses fundos – mais buracos que precisam ser apuradas as responsabilidades do Governo e dos demais gestores dos fundos).
A última tese refere-se aos argumentos voltados à importância da agricultura para o cenário nacional. Isso é fato, mas não para desidratar as acusações de maquiagem nas contas públicas, sob o patrocínio e autorização da Dilma. Disse a Ministra: "vamos refletir sobre a importância da agricultura. Talvez o mais importante que temos para garantir prosperidade do agronegócio, do pequeno e do médio produtor. A agricultura responde por 52% das exportações, 37% do emprego e ¼ do PIB nacional. Esses produtores não merecem subvenção apenas, merecem aplausos".
Sinceramente, ninguém falou, na peça acusatória, que os produtores rurais não mereçam subsídios. Isso é mentir, ministra. Falou-se da irresponsabilidade do Governo, e particularmente da Presidente Dilma em gastar demais e não cumprir com seus compromissos junto aos bancos. Se houve atrasos e descontroles, foi por excesso de gastos do Governo. Afinal, se o produtor atrasar o pagamento de seus empréstimos de crédito rural, o banco começa a contar juros de mercado desde o primeiro dia, processa o produtor, executa as garantias e suja seu nome na praça. Qual a diferença que tem entre a pessoa do produtor e a do presidente da república, nas suas responsabilidades administrativas, civis e penais? Respeitadas as questões de representação e de foro, um sendo o chefe da República, e o outro o chefe de família e administrador de sua propriedade rural, ambos tem as mesmas responsabilidades, cada um no seu quadrado.
Na verdade, ao citar a agricultura, em razão dos desmandos com os recursos públicos, o que inviabilizou o pagamento dos recursos de subsídios que o próprio Governo concedeu e redundando em pedaladas fiscais, a Ministra cometeu um grande desserviço a todos os produtores: Jogou todos eles no furacão do impeachment. Jogou pela amizade com a Dilma, distorceu intencionalmente os fatos, e traiu os produtores brasileiros. O agronegócio não merece isso.
Wolmar Roque Loss
Engenheiro Agrônomo e Advogado, Mestre em Economia Rural e
Desenvolvimento Econômico