O Brasil ganha espaço na produção mundial de café, mas perde na de agregação de valor ao produto. O país não tem mais a liderança mundial nas exportações de solúvel e teve reduzido o número de fábricas e de trabalhadores no setor nos anos recentes.
As causas? Uma delas são as barreiras não tarifárias que impedem a importação de café verde pelo país.
E os números mostram que o setor teria muito a ganhar e pouco a perder com a eliminação dessas barreiras. É o que aponta estudo da professora da UnB (Universidade de Brasília) e pesquisadora visitante do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Krisley Mendes.
O Ipea avalia barreiras não tarifárias impostas a alguns produtos pelo Brasil e os efeitos que elas trazem ao setor do agronegócio.
“A agenda de abertura comercial que precisamos enfrentar deve também repensar o uso de instrumentos não tarifários de política comercial, buscando estimular o aumento da produtividade e da concorrência”, diz Ivan Oliveira, diretor de estudos internacionais do Ipea.
O estudo de Krisley mostra que, se eliminadas as barreiras e os custos portuários e fitossanitários na importação do café robusta verde, a participação do café nacional na industrialização cairá pouco, de 99,80% para 99,59%.
Em compensação, a participação do Brasil no mercado mundial subiria 8,26 pontos percentuais, devolvendo a liderança mundial ao país.
Em 2010, o Brasil tinha 20% do mercado mundial de café solúvel; a Indonésia, 2%. Em 2016, a participação do país era de 12%; a da Indonésia, de 18%.
Para a pesquisadora, custos menores na importação do grão da espécie robusta seriam importantes para evitar perda de competitividade do país no mercado internacional, principalmente nos períodos de baixa oferta interna.
Para ela, o café brasileiro é competitivo, o que lhe garante perda pequena em relação ao importado no market share da industrialização do produto. Há períodos, porém, que a oferta pode ficar reduzida.
Em 2011, o preço do café brasileiro era 38% inferior ao do de outros países. As diferenças caíram nos anos seguintes, para 11%.
De 2012 a 2016, a produção de café arábica cresceu 12%. Já a do robusta caiu 38%. Enquanto o preço interno nominal do arábica subiu 26%, o do robusta ficou 57% mais caro.
A produção do café robusta foi severamente afetada pelo clima nos últimos anos no Brasil. Com volumes de 13 milhões de sacas por ano, a produção de 2016 recuou para apenas 7,5 milhões, reduzindo a oferta interna.
Esse cenário não é bom para a indústria, que tem contratos a cumprir. Não cumprindo, abre espaço para os concorrentes. “Não será fácil reconquistar esse cliente”, diz Krisley.
Para ela, o Brasil foi o único país entre os principais produtores e exportadores a não registrar importação de café verde de 2000 a 2016. Nesse período, o Vietnã importou 6,5% do que exportou, a Indonésia, 53% e a Colômbia, 62%.
A importação de café verde parece não afetar a posição dos países no comércio internacional, já que os produtores que permitem a compra externa têm mantido sua posição no mercado, acrescenta a pesquisadora.
Uma das soluções apontadas pela indústria para melhorar a competitividade do produto brasileiro é a adoção de medidas não tarifárias menos severas, especialmente na compra de café robusta.
Krisley diz que é necessário um debate sobre as políticas nacionais dedicadas ao café, uma vez que asiáticos e europeus avançam em elos de maior valor agregado na cadeia.
O Brasil tem 65 regulamentos que apresentam medidas não tarifárias vigentes para a importação de café.
A concorrência com os asiáticos ficará cada vez mais acirrada, principalmente após a inauguração de novas fábricas na região e a alta de preços do produto no Brasil.
A exportação brasileira de café solúvel teve crescimento anual de 3,3% de 2000 a 2016. Os demais países exportadores aumentaram as vendas em 7,5% ao ano.
O Brasil passou por um período de fechamento de empresas e de concentração de mercado. Em 1996, eram 19 empresas exportadoras de solúvel. Em 2016, apenas seis.
O quadro de emprego caiu de 4.103, em 2001, para 3.767 em 2016. Os salários recuaram 13% em termos reais.
Vaivém das Commodities
A coluna é assinada pelo jornalista Mauro Zafalon, formado em jornalismo e ciências sociais, com MBA em derivativos na USP.
Folha de São Paulo