Os automóveis passaram à frente do trigo, pela primeira vez na história, como principal produto importado da Argentina pelo Brasil. O aquecimento dos mercados automobilísticos no Brasil e na Argentina estimula o governo brasileiro a reivindicar do sócio no Mercosul regras mais estáveis para o livre comércio de produtos do setor entre os dois país, hoje sujeito a um regime especial, com limites – confortáveis – para importações. O atual acordo automotivo Brasil-Argentina expira em julho.
“O fim do prazo do atual acordo automotivo nos preocupa bastante, queremos ter uma proposta de mais longo prazo”, disse ao Valor o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho. O governo quer usar a viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para negociar a abolição das travas no comércio automotivo. “O momento é bom para isso.”
Em 2007, as exportações de automóveis de passageiros da Argentina ao Brasil chegaram a US$ 1,65 bilhão, dos quais US$ 434 milhões só em carros populares, com menos de 1 mil cilindradas. A venda de carros pequenos da Argentina ao Brasil cresceu quase 480% e é um forte sinal de mudança: antes, as exportações argentinas eram quase exclusivamente de modelos de maior luxo. As importações brasileiras de trigo foram prejudicadas pelas barreiras à exportação criadas como medida antiinflacionária pelo governo argentino, mas, ainda assim, cresceram 30% em relação a 2006 e ficaram em US$ 1,16 bilhão.
Essa estatística não inclui as vendas argentinas de motores, peças e componentes, nem de utilitários, como as camionetes movidas a diesel, que são usadas no Brasil como carros de passeio e que aumentaram 30% e superaram US$ 220 milhões. O saldo do comércio automotivo ainda é favorável ao Brasil: somadas apenas as exportações de veículos leves de passeio, as vendas brasileiras aos argentinos somaram US$ 1,81 bilhão no ano passado.
“A Argentina está recebendo muito investimento do setor automotivo e aumentando as exportações, o que deve facilitar um consenso sobre o tema”, acredita o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Jackson Schneider. A Anfavea mantém contatos regulares com a congênere argentina, Adefa, e as duas associações devem se reunir em fevereiro, para discutir o assunto.
Apesar do otimismo do dirigente da associação brasileira, é grande a resistência no governo e no setor privado argentino para liberalizar completamente o mercado automotivo nas transações entre os dois países, por medo de perder investimentos para o atraente mercado brasileiro.
Hoje, existe um sistema conhecido como “flex”, que fixa um limite pelo qual as exportações de um país ao outro não podem superar o equivalente a 1,9 vezes o que é importado do parceiro. O fim desse limite permitiria negociar com Uruguai e Paraguai a incorporação do comércio de automóveis, peças e partes ao regime comum do Mercosul, extinguindo uma das maiores exceções à União Aduaneira entre os quatro países. “Nosso objetivo é “mercosulizar” o comércio automotivo, e isso pode ser feito de maneira gradual”, sugere Ivan Ramalho.
“Já houve muita assimetria entre os setores automotivos do Brasil e argentina, mas agora a situação já permite uma convergência”, concorda o diretor de assuntos institucionais da Fiat, Antônio Sérgio Martins Mello, vice-presidente da Anfavea. Ramalho afirma que o mínimo aceitável é a extensão dos prazos para as regras do regime automotivo, hoje limitadas a um ano, o que é considerado no Brasil prazo excessivamente curto. “Precisamos alongar os prazos e simplificar procedimentos. Um ano é muito pouco para assegurar tranqüilidade aos investidores”, argumenta o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento.
Valor Econômico