OPINIÃO: Sai pra lá, Cuca!

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por Franco Fiorot e Enio Bergoli*

Sai pra lá, Cuca!

A obra Sítio do Picapau Amarelo, escrita pelo autor brasileiro Monteiro Lobato entre os anos de 1920 e 1947, é um marco da literatura nacional e vem atravessando gerações nas últimas décadas. Em todos esses anos de convívio com a família brasileira, os personagens deste clássico nunca foram tão ‘afrontados e usados’ como no último sábado (03), no programa televisivo Zorra Total, que exibiu o quadro satírico ‘Sítio do Picapau com Sequela’.

Utilizando personagens da obra de Lobato e uma paródia com a música que marcou época, o programa relacionou o uso dos produtos químicos utilizados para combater pragas nas lavouras com graves riscos à saúde humana. Estimular esse pensamento na sociedade brasileira, sobretudo com personagens infantis, com piadas superficiais, sem trazer à tona dados científicos da eficiência e segurança dos defensivos agrícolas na produção de alimentos para toda nação, é um desserviço e uma irresponsabilidade ao país.

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) realiza no país o monitoramento da qualidade dos alimentos consumidos in natura. Em resumo, os dados oficiais apontam que, das 12 mil amostras pesquisadas, apenas 3% indicaram resíduos de produtos químicos acima do limite máximo permitido (LMR). Mas isso não significa, necessariamente, que essas amostras acima do LMR causem danos à saúde e deixem sequelas, já que a margem de segurança estabelecida nos estudos para liberação dos produtos, em geral, é 100 vezes abaixo da dose nociva, determinada em laboratórios, para cobaias.

A brincadeira, de muito mau gosto, do Zorra Total, cita a liberação de novos registros de defensivos agrícolas no Brasil este ano (foram 290 registros liberados para uso). Quase a totalidade são misturas comerciais de substâncias anteriormente aprovadas ou ‘genéricos’ de moléculas já existentes, e também produtos naturais para controle biológico. Agora, você compra e consome mais remédio por ele ser genérico e mais barato? Não! No campo também é assim. Para reflexão, registra-se que nas cidades há inseticidas similares disponíveis em supermercados para controle de mosquitos.

O que está havendo é que novas tecnologias, com formulações mais atualizadas, menos tóxicas e mais eficientes, estão sendo liberadas com mais agilidade, mas seguindo os estudos científicos necessários. Isso não está atrelado ao aumento de utilização. Pelo contrário, haverá substituição de produtos antigos por novidades tecnológicas, que se traduzirá em mais benefícios ambientais e econômicos.

No sítio do Pica Pau Amarelo real, do verdadeiro Brasil, o da agricultura dos trópicos, do calor constante, das altas temperaturas e umidade, fatores que contribuem para o surgimento de pragas nas plantações, que precisam ser combatidas de várias formas (entre elas utilizando controle químico), os campos e plantações estão verdes e produtivos, alimentando nosso país. E ainda, preservando. O conjunto dos territórios protegidos e preservados no Brasil totaliza 423 milhões de hectares ou 49,8% do Brasil, e equivale à área de 28 países da Europa, de acordo com dados da Embrapa.

A série da mesma obra de Monteiro Lobato foi transformada para o formato de história em quadrinhos, em 2003, pela Editora Globo, para a campanha do enfrentamento da fome e da miséria no Brasil do então Programa Fome Zero, intitulado ‘Emília e a Turma do Sítio no Fome Zero’. Certamente, na luta por diminuir a fome no país, além de melhorar estratégias de distribuição de renda e logística de abastecimento de alimentos, deve-se atentar para técnicas de elevação de produtividade, o que o Brasil já é referência mundo afora. Produz mais de 230 milhões de toneladas de grãos utilizando apenas 7,8 % da área do país. É referência em produtividade mundialmente. E, lembre-se, preservando metade do território nacional, fato que é referência também!

O doutor Caramujo, o médico do Reino das Águas Claras da obra infantil, que tem várias pílulas que curam qualquer doença, deve receitar sempre para turma do Sítio as doses adequadas para tratar os males do corpo humano. No campo, nas lavouras, especialistas também indicam os defensivos agrícolas, os remédios das plantas, seguindo receitas agronômicas com base em estudos e testes previamente aprovados.

Os produtores rurais são aguerridos, garantem índices positivos para a economia nacional, geram emprego e renda pra todo nosso país nessa indústria a céu aberto que é a agricultura, vulnerável ao clima como nenhuma outra atividade econômica, com incertezas de mercado de não saber o preço que irá vender o seu trabalho de vários meses. Mas mesmo assim, vez ou outra na mídia, aparece a Cuca, aquela bruxa com rosto e corpo de jacaré, que o que mais faz é produzir poções e planejar como invadir o Sítio.

Sai pra lá, Cuca! Nossa agricultura é séria, produtiva e segura. E não uma peça de (mau) humor!

 

*Franco Fiorot

Especialista em Comunicação Integrada e em Gestão do Agronegócio, Secretário de Agricultura de Linhares (ES)

Enio Bergoli

Engenheiro Agrônomo, especialista em Administração Rural e Ex-Secretário de Estado da Agricultura

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