Nos últimos meses, a movimentação de commodities agrícolas teve impacto nas duas principais atividades do agronegócio capixaba: café e produção animal, em especial a avicultura e a suinocultura. As políticas públicas adotadas foram pelo favorecimento à importação de milho e restrições à importação de café verde.
Desde 22 de abril, o Governo Federal zerou a tarifa de importação de milho de todos os países, que era de 8%, à semelhança do que já ocorria nas transações com o Mercosul. A medida visa o aumento da oferta do cereal no mercado doméstico, onde os preços estão em patamares recordes, o que afeta margens de produção de carnes e ovos. A validade é por um período de 180 dias, para uma cota de 1 milhão de toneladas.
Em meados de maio, o Governo do Espírito Santo isentou a cobrança de ICMS na importação de milho. Com outros 12% a menos nos custos de aquisição da matéria prima, abre-se uma possibilidade de redução dos custos de produção dos avicultores e suinocultores capixabas. O objetivo é o de garantir a competitividade desses segmentos que consomem 750 mil toneladas de milho por ano.
Em relação ao café, também no mês de maio, o Ministério da Agricultura aprovou o procedimento de Análise de Risco de Pragas (ARP), com base em documentações apresentadas pelo Peru. Assim, em tese haveria conformidade para evitar riscos fitossanitários. Uma novela que se arrasta desde maio de 2015, com Resoluções do Mapa, aprovando e suspendendo essa liberação.
O fato é que a maioria dos técnicos brasileiros considera frágil o sistema fitossanitário daquele país. Não se trata de conservadorismo comercial. Pragas como ferrugem e broca, duas das mais temidas do parque cafeeiro nacional, foram introduzidas por falta de cuidados fitossanitários nas nossas relações comerciais.
Após forte reação de contrariedade dos cafeicultores brasileiros à importação de café verde, associada a um novo Governo de transição, devido ao processo de impeachment, houve acordo para a suspensão dessa operação. A decisão é correta porque pragas poderão afetar o nosso parque cafeeiro, que foi construído em mais de 200 anos de cultivos comerciais.
Não há incoerência em se liberar uma e barrar outra matéria-prima. São situações distintas. O Brasil está entre os três primeiros produtores, é segundo exportador e aproveita-se de uma janela favorável de preços internacionais para ampliar sua fatia no mercado externo do milho. Contudo, os preços internos estão 50% acima de uma relação histórica de preços com a soja, dois ingredientes básicos para a alimentação animal.
Custos altos para a aquisição de milho prejudicam os produtores brasileiros de carnes e de ovos, cadeias produtivas de grande destaque socioeconômico. Em síntese, mesmo com a importação, a situação ainda é favorável tanto para produtores de milho quanto para avicultores e suinocultores.
Por outro lado, o Brasil é o maior produtor e exportador mundial café, além de segundo mercado consumidor. Ao contrário do milho, o café de outros países compete no gigante mercado interno brasileiro, que consome 21 milhões de sacas ao ano. Além disso, a importação de café verde poder trazer novas pragas e promover a competição desleal com países que não seguem rigorosas legislações ambientais e sociais, como as vigentes no Brasil. Fatos não observados nas importações de milho.
Assim, a criação de mecanismos para frear a importação de café e favorecer a de milho, por uma janela de tempo até que o mercado se normalize, aliada a medidas que protejam os nossos plantios de pragas presentes em outros países, é uma decisão que tem coerência e consistência com o gigantismo do agronegócio brasileiro.
Enio Bergoli
Engenheiro Agrônomo, Diretor Geral do DER-ES, Coordenador de Política Agrícola da Sociedade Espírito-Santense de Engenheiros Agrônomos
Artigo publicado na Revista Campo Vivo – Edição 30 – Jun/Jul/Ago 2016