ARTIGO: O fato e o boato, ou vice e versa

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*por Geraldo Ferreguetti

A agricultura, como toda atividade econômica, está extremamente sujeita aos boatos, e principalmente agora que o mundo reverencia o agro brasileiro como modelo de eficácia e sustentabilidade.

Lógico que não podemos esquecer dos derrotistas de plantão que teimam em depreciar a atividade que alimenta 1.5 bilhões de pessoas no mundo e de quebra mantem intacta a maior floresta tropical do globo e nem uma pequeníssima parcela da produção agropecuária brasileira que teima em continuar errando,  estes devem ser analisados a parte.

Mas voltemos à questão do tema: boato e fato.

No segundo semestre de 2021, logo depois do final da safra do café, e antes do início do plantio da safra de soja, momento bem oportuno, surgiu um forte boato de que os insumos agrícolas: defensivos e adubos iriam sofrer uma forte retração na oferta.

Sem explicar bem porque, alegavam escassez de energia nos países produtores, principalmente Rússia e China e excesso de consumo de defensivos pelo plantio da soja, com preços superaquecidos e etc.

O que valeu foi que os preços dos insumos, adubos e defensivos dispararam de forma exponencial, baseado apenas no “boato” de que iriam faltar. E todos, sem exceção, embarcamos nesta mentira.

Veio o plantio da soja, executado com perfeição dentro do prazo estabelecido pela pesquisa, talvez um dos mais assertivos dos últimos 05 (cinco) anos. No Espirito Santo adubação e condução das lavouras de café, principal atividade da agricultura capixaba ocorreu dentro da maior normalidade, até ajudada pela boa precipitação ocorrida no período. A única anormalidade observada foram os preços, que triplicaram.

O desastre não foi maior, pois os bons preços das comodities com uma boa capitalização dos produtores, possibilitaram a uma grande parcela destes verdadeiros heróis nacionais comprarem os insumos à preços exorbitantes.

Não faltou produto, mas o boato fez os preços dispararem.

Agora veio a crise da guerra Rússia x Ucrânia, um fato, que realmente pode impactar em muito a oferta de adubos a base de potássio, insumo fundamental para nossa fabulosa agricultura.

Foi exatamente este fato, a guerra, que provou que a tão comentada falta de insumos no ano passado era um grande boato.

Ouvimos de todos os fabricantes de insumos (adubos e defensivos), e até da nossa competente ministra, que o problema agora não é a falta, pois todos alegam terem produtos em estoque e ou comprados dos fornecedores em quantidade suficientes para atender a nossa agricultura.

Agora o vilão é a logística causado pelas inoperabilidade dos principais portos europeus/asiáticos, dificultando a entrega, e as dificuldades de efetivação das transações bancárias para efetivação das compras causadas pelas sanções desencadeadas pela guerra.

A guerra é um fato, mas se analisado com bastante serenidade e sem alarmismo, pode também ser um boato.

Estamos nos aproximando do inverno na parte tropical do globo, quando as plantas brasileiras entram em merecidas férias. Nesta época as plantas sob o ponto de vista fisiológico reduzem o seu metabolismo necessitando de menos adubos e as condições do clima com temperaturas mais baixas e pouca umidade, inapropriadas para a maioria das pragas e doenças que afetam nossas lavouras. Ou seja, temos uma dependência infinitamente menor do que no verão tropical.

Só para exemplificar: o milho safrinha já está plantado, adubado e protegido; o café idem, exceção de alguns produtores de alta tecnologia que ainda fazem uma adubação em março, mas basicamente nitrogenada. Temos uma situação de tranquilidade até setembro quando então a nossa necessidade de adubação aumenta, ou seja, temos ai 06 (seis) meses para procurarmos uma solução para o problema o que pode ser feito com tranquilidade sem alimentar um boato que pode gerar apenas um fato: aumento de preços.

Mas precisamos fazer o nosso dever de casa, não podemos ser tão dependentes de importação de adubos com uma agricultura tão eficiente. Sabemos que em épocas “normais” o preço de importação chega a ser de 10 a 15 vezes menores do que produzir aqui, mas é uma questão de estratégia e estes investimentos são da iniciativa privada, cabe ao governo o papel de suavizar as relações entre produção e ambiente sem necessariamente termos que matar índios para produzir adubos.

Temperança.

Geraldo Ferreguetti, Engenheiro Agrônomo

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