ARTIGO: Comentários à Medida Provisória 927/2020

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­O impacto do COVID-19 no mundo e no Brasil fez com que o Governo Federal se movimentasse, a fim de amenizar os prejuízos econômicos e sociais. Para isso, a União visou principalmente a proteção das atividades empresariais e suas respectivas relações trabalhistas, de modo a minimizar as perdas dos empresários, bem como dos trabalhadores, evitando uma escalada no desemprego.

Analisemos os dispositivos mais relevantes instituídos pelo Governo Federal na Medida Provisória 927/2020 e seus impactos no âmbito jurídico. Alguns dispositivos complementares estão na MP 936/2020, que serão abordados posteriormente.

ACORDO (Art. 2º)

Um dos mais importantes pontos da MP 927 está no seu art. 2º, que possibilita um acordo individual por escrito entre empregador e empregado, para que se mantenha o vínculo empregatício. Esse acordo, segundo o artigo, terá preponderância sobre instrumentos normativos, legais e negociais, desde que respeite a Constituição Federal.

Comentários: Durante o período do estado de calamidade pública (que vai até 31 de dezembro de 2020), tudo que for acordado individualmente entre empregado e empregador, terá prevalência sobre CLT, convenções e acordos coletivos, respeitada a Constituição. (Obs: dispositivo importante para o empresário, mas que poderá futuramente ser declarado inconstitucional)

TELETRABALHO (Art. 4º)

Outra mudança está relacionada ao teletrabalho, conforme o art. 4º da Medida. De acordo com o artigo, a alteração do regime presencial para o regime de teletrabalho, trabalho remoto ou qualquer outra forma à distância, bem como o retorno destes regimes para o presencial, será feito a critério do empregador, independente de acordos individuais ou coletivos e do registro prévio da alteração no contrato.

Comentários: A alteração a critério do empregador é bem diferente do disposto na CLT, que exige prévio acordo e alteração no contrato do trabalho. Durante a vigência desta MP, não é exigido o acordo prévio nem a alteração prévia no contrato, diante da necessidade de rápida alteração devido à atual situação.

A única exigência é que o empregador deve informar ao empregado da mudança em antecedência de no mínimo 48h, por escrito ou por meio eletrônico viável.

ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS (Art. 6º)

Durante o estado de calamidade pública e a vigência desta MP, o empregador poderá antecipar férias individuais aos seus empregados, informando, no mínimo, 48 horas antes, por escrito ou meio eletrônico, indicando o período das férias. Em relação as férias, deve se observar algumas regras.

Comentários: afim de manter o emprego dos trabalhadores e aproveitar o período de inatividade de empresa, o empregador pode antecipar férias individuais do empregado. Para isso, deve observar algumas regras:

  1. A antecipação das férias deve ser informada ao empregado com, no mínimo, 48 horas de antecedência (art. 6º);
  2. As férias antecipadas não poderão ser em períodos inferiores a 5 dias (§ 1º, I);
  3. Podem ser concedidas mesmo que o empregado ainda não tenha completado o período que lhe dá direito (12 meses); também pode inclusive ser negociado entre empregado e empregador antecipação de férias futuras, por acordo individual escrito (§ 1º, II e § 2º);
  4. Trabalhadores do grupo de risco do coronavírus terão prioridade na antecipação de férias (§ 3º);
  5. O valor do adicional de 1/3 de férias poderá ser pago após a concessão destas, até o dia 20/12/2020, ou seja, junto ao 13º salário (art. 8º);
  6. O pagamento das férias antecipadas poderá ser feito até o quinto dia útil do mês subsequente ao início das férias (art. 9º).

Obs.: regra para os profissionais da saúde é diferente, sendo possível, ao contrário do exposto acima, que sejam suspensas as férias ou licenças não remuneradas desses profissionais, por desempenharem funções essenciais. Comunicação deverá ser por escrito ou meio eletrônico, de preferência com 48 horas de antecedência.

CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS (Art. 11)

O empregador também poderá conceder férias coletivas aos seus empregados durante o estado de calamidade pública. Os trabalhadores que receberão férias coletivas deverão ser informados também com, no mínimo, 48 horas de antecedência.

Comentários: O mais importante em relação as férias coletivas na MP é que não se aplicam os limites estabelecidos pela CLT (férias em 2 períodos anuais e cada período de no mínimo 10 dias).

Ainda mais importante, de acordo com a MP (art. 12), é que estão dispensadas as comunicações prévias ao órgão local do Ministério da Economia e aos Sindicatos da respectiva categoria profissional.

APROVEITAMENTO E ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS (Art. 13)

Durante o estado de calamidade pública, os empregadores poderão antecipar feriados federais, estaduais, distritais e municipais, desde que não sejam religiosos, mediante comunicação por escrito ou meio eletrônico com pelo menos 48 horas de antecedência.

Feriados religiosos também podem ser antecipados, porém essa antecipação depende de concordância do empregado, e será por manifestação em acordo escrito.

Comentários: Feriados que ocorram durante o estado de calamidade pública podem ser antecipados, bastando que o empregador apenas notifique seus empregados beneficiados no mínimo 48 horas antes. Ainda, esses feriados poderão ser utilizados para compensação em banco de horas.

BANCO DE HORAS (Art. 14)

Poderá ser estabelecido um regime especial de banco de horas para compensação de jornada, em favor do empregador ou do empregado, a ser estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual formal. As horas poderão ser compensadas no prazo de 18 meses após o fim da calamidade pública (31/12/2020).

Comentários: Com base nesse artigo, caso a empresa tenha que interromper suas atividades por alguns dias, poderá estabelecer um regime especial de banco de horas em relação a esses dias, de modo que possa, quando a empresa retomar as atividades, “cobrar” esses dias em que o empregado ficou sem trabalhar.

Isso pode ser feito mediante acordo coletivo ou individual formal, e pode ser compensado em até 18 meses após dia 31 de dezembro de 2020, data em que se encerra o estado de calamidade pública. A compensação será determinada a critério do empregador, independente de convenção ou acordo individual ou coletivo.

PRORROGAÇÃO DO RECOLHIMENTO DO FGTS (Art. 19)

De acordo com o art. 19, o empregador não precisará recolher o FGTS das competências de março, abril e maio de 2020 (que vencem em abril, maio e junho respectivamente).

Comentários: o empregador poderá pagar o FGTS referente aos meses acima de forma parcelada, em até 6 meses, sem incidência de juros, atualização, multa ou encargos (art. 20 e § 1º). Lembrando que em caso de rescisão do contrato de trabalho, as parcelas terão sua data de vencimento antecipada para o prazo previsto no art. 18 da Lei 8.036/90 (depósito do mês da rescisão e do anterior, caso ainda não tenha sido recolhido).

TRABALHADOR QUE CONTRAI O COVID-19 (Art. 29)

Caso o trabalhador contraia o vírus COVID-19, a doença não será considerada doença ocupacional, salvo se o trabalhador demonstrar por meio de provas que existe o nexo causal da sua ocupação com a contaminação pelo vírus.

Comentários: o artigo em questão traz segurança jurídica ao empregador, caso o seu empregado contraia o COVID-19. Como o vírus já está bastante espalhado, o artigo evita má-fé do trabalhador ao exigir que, pare que seja considerada doença ocupacional, o trabalhador prove que contraiu o vírus em decorrência da sua ocupação.

ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS (Art. 30)

De acordo com esse artigo, acordos e convenções coletivas que venceram ou irão vencer, dentro de 180 dias a partir da vigência desta MP, podem ser prorrogados a critério do empregador por 90 dias.

Comentários: caso queira, o empregador pode prorrogar acordos ou convenções coletivas, que venceram ou vencerão dentro de 180 dias a partir da vigência da MP 927 (22/03/2010). A prorrogação poderá ser de até 90 dias, contados do fim do prazo de 180 dias após a publicação da MP.

CONVALIDAÇÃO DAS MEDIDAS (Art. 36)

As medidas trabalhistas adotadas por empregadores, que não forem contra esta MP 927, que forem tomadas no período de 30 dias antes do dia 22/03/2020 (início da vigência da MP), estarão convalidadas.

Comentários: caso o empregador já tenha tomado alguma das medidas previstas na MP 927 nos últimos 30 dias antes da sua publicação, estas medidas estarão convalidadas, ou seja, serão consideradas de acordo com a MP, e consequentemente, legais. (Obs: este dispositivo não é aconselhável, pois poderá ser discutida uma possível inconstitucionalidade)

 

Por Caio Francisco Fiorot, Advogado Tributarista e Trabalhista, OAB/ES nº 33.663

E-mail: fiorotcaio@gmail.com

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